29/09/2015

Se você tem medo do amor, tem coragem de quê?


Já lhe disse vezes demais que nem sempre a vida nos satisfaz do modo como acreditamos merecer. E que nenhuma dor não vêm tão forte a ponto de nos entregarmos à ela de bandeja. E que, por quantas vezes você já tenha repetido os mesmos erros do passado, talvez só signifique que está na hora de mudar o método.

Canso de ouvir as pessoas falando que desistiram do amor, como se fosse a obrigação de outra pessoa amá-las de volta quando o sentimento bate forte no peito. Canso de saber que o mal é tão inerente ao ser humano quanto a bondade também faz parte, e que assim como nada pode ser tão ruim que não possua uma virtude, nada pode ser tão perfeito que não tenha um defeito.

Canso de pensar que você não entendeu ainda que a vida é um reflexo: ela lhe dá aquilo que você transmite. E você se cansa de me ouvir falando assim, tão sonhadora-idealista, e julga-me por ingênua. Ora, como posso eu dizer que a vida nos dá aquilo que nós refletimos, se tantas pessoas no mundo refletem o bem mas só colhem amargura?

Sei que pareço a rainha mimada que vive longe da realidade quando assim falo, mas entenda-me: tenho uma visão poética sobre o mundo. E ao poeta é justo e necessário que se veja o mundo com o copo meio cheio, ou meio vazio. É preciso ser otimista ou pessimista no modo geral de encarar o mundo, mas que a verdade seja dita: não está fácil para ninguém.

Então isso me permite o direito de me lamuriar?

Canso de saber que a vida poderia ser mais simples, se nós assim quiséssemos. Mas somos humanos imperfeitos, e nosso defeito é estragar. Causar um estrago em tão simples coisas que nos rodeiam a vida. Canso, de pessoas descrentes em sua própria bondade. Que perderam a esperança no dia melhor que virá. Que desistem do amor na primeira tentativa frustrada, sem se darem conta de que a vida é um conjunto de tentativas frustradas que em algum momento, darão certo.

Canso. Por saber que a vida poderia ser mais simples. Que vivemos pelos pequenos atos de coragem que nos movem, e não há ato de coragem maior do que entregar-se ao sentimento quando brota, sem fazer a mínima de para qual caminho lhe levará.

Canso de amores vazios, de vazio sem amor. De lua encoberta pela nuvem. De tudo aquilo que não preenche, e nem subtrai do meio copo. Canso, daqueles que não tem coragem de dar a cara a tapa quando uma nova paixão surge, pela sombra do que restou do passado.

Agora não se faça de desentendido, como se não entendesse o porquê.
Mas se você tem medo do amor, tem coragem de quê?

23/09/2015

Uma dose de inspiração: Raphael Draccon

Eu nem estava feliz por ter conhecido o Raphael. 

Ontem teve uma viagem literária aqui onde moro, com a presença de Raphael Draccon (um dos escritores mais influentes no Brasil atualmente). Devo dizer que desde que li a Trilogia Dragões de Éter, os livros desse autor já haviam ganhado um espaço no meu coração. 

Foram livros muito bem escritos, envolventes, e marcantes. Agora estou lendo Fios de Prata, e a sensação é a mesma: Raphael é um dos mais proeminentes escritores nacionais. 

"Existem poucas coisas, bem poucas, pelas quais vale a pena viver ou morrer. O amor é uma delas." (Trecho de Dragões de Éter - Corações de Neve). 

Como se não bastasse, ao conhecê-lo pessoalmente, pude ter a convicção de que Raphael não se trata apenas de um excelente escritor. Ele é uma pessoa ótima, super carismático, de uma humildade impressionante. 

O autor contou sua jornada para se tornar o escritor que ele sempre quis ser, como superou seus problemas e aprendeu lições valiosas no decorrer de sua vida. Com uma história de vida inspiradora, Raphael nos comove com seus relatos familiares sobre sua avó ser morta pelo alcoolismo, com um pai que foi o primeiro a dizer que ele morreria de fome se quisesse ser "escritor", e também, como o mesmo apoiou-o no momento do lançamento de seu livro. 

Falou sobre o falecimento de seu pai (um dia após o lançamento do livro na Bienal), e como a melhor e a pior coisa do mundo estavam acontecendo com ele ao mesmo tempo. Mas se tem uma lição que ele tirou disso tudo, é que a vida segue. Ela sempre deve seguir, independente de para qual caminho esteja indo, e naquele momento, ele estava caminhando em direção à vida que gostaria de ter. 

E o mais importante de tudo, foi concluir sua palestra com o motivo pelo qual ele descobriu que realmente queria ser escritor: para fazer as pessoas voltarem a acreditar que ainda é possível sonhar. Que muitas vezes, o impossível torna-se possível, e que nosso destino só depende de nós mesmos. 

Desde que nunca deixemos de sonhar. 

Draccon deixou diversas lições valiosas para aqueles que tiveram o privilégio de estarem assistindo sua palestra, mas não me deixou dúvidas de que se eu já gostava imensamente dos livros dele, agora o admiro muito mais ainda por ser quem ele é. 

Com carinho, 
Juliana Rodrigues. 

06/09/2015

Cinza, céu cinzento! - Cecília Albuquerque


Céu cinzento sob as nuvens do prédio. Cobertura alta, topo do arranha-céu. Os telhados perversos apoiavam ao chão meus pés em pedra. Pedra em pé eu sou, firme como o concreto que me sustenta. Sobrevoo ao além nuvens. Cinza, céu cinzento.  Para onde foi minha paz, onde busco meu alento? Minha asa quebrada. Meus pés de pedra que tocam o chão tão duro. Sujo. Frio.

Meu corpo em transformação. Eterna metamorfose que me deleita o corpo e não acaba mais. Petrifico-me às mãos, já não sinto meus pés. Minha alma inocente atingida, e eu que só queria seguir meu destino em paz. Em uma pequena paz que nunca encontrei, e jamais terei a sorte de tê-la em tal mundo que transformou minha carne em pedra.

Sobrevoo ao topo, na eterna fuga. Fugindo de mim mesma, e das sombras que me permeiam. As asas de minha gárgula petrificam minhas costas. Cinza, céu cinzento. O dia está sumindo, como sumo de mim mesma. O topo do arranha-céu, com todas as suas cores e visão para a cidade – corrida, agitada, opaca. Igrejas, lojas, lanchonetes. Carros, ônibus e motos. – num cruzamento sem fim.

Descanso minhas asas já exaustas de tanto sobrevoarem o amanhecer. Está na hora de anoitecer em mim. Não lembro quando me tornei o que sou. De quando você se tornou também. Lembro-me de quando éramos apenas ruídos na escuridão. Indolores. Não fazíamos nada de errado. Mudo de rota, mantenho a trajetória. Onde, no final deste caminho, encontrarei minha vitória?

Éramos corpos leves de almas pesadas. Quando nos tornamos corpos pesados de almas insuportáveis de serem carregadas? Cinza, céu cinzento. Onde está o meu alento? Quero adormecer quando as estrelas vierem, e acordar quando elas nos deixarem na solidão.

Foge. Ainda dá tempo? Se der, não esqueça que nosso céu sem nuvens estará olhando por nós quando voltarmos. Cinza, céu cinzento.

Oh, tenebrosa escuridão. Quando deixei de ser gente, e me tornei essa simples pedra? Tão dura. Tão suja. Tão fria.

Cinza, céu cinzento.  


Cecília Albuquerque. 


P.S.: Sou Cecília Albuquerque. Embora também seja Juliana Rodrigues, e vez ou outra, Julianna Rodríguez. E Laura Belmonte. Sou várias pois sou escritora e ao escritor se dá o direito de ser vários. Vários pseudônimos. Vários heterônimos. E principalmente, ao ser humano se dá o direito de ser diversos, pois dentro de cada um, existe um mundo. Uma imensidão que muda e se adéqua a diversas fases da vida. Vez ou outra, serei Cecília Albuquerque. Ou então, Laura. Mas em meu íntimo, sempre serei Juliana. 

Inspirado em Lispector. 

03/09/2015

Entre aspas: A mágoa mortal - Clarice Lispector


 Os telhados sujos a sobrevoar, arrastas no voo a asa partida. Acima da igreja as ondas do sino te rejeitam ofegante até a areia da praia. O abraço consolador não podes mais suportar pois amor estreita asa doente. Sais gritando pelos ares em horror, sangue escoa pelos telhados. Foge, foge para o espanto da solidão, pousa na rocha, estende o ser ferido que em teu corpo se aninhou: tua asa mais inocente foi atingida. Mas a cidade te fascina. Insistes lúgubre em brancura carregando o que se tornou o mais precioso: a dor. Voas sobre os tetos em ronda de urubu. A asa pesa pálida na noite descida em pálido pavor. Sobrevoas persistente a cidade fortificada e escurecida — capela, ponte, cemitério, loja fechada, parque morto, floresta adormecida, folha de jornal voa em rua esquecida. Que silêncio na torre quadrada. Espreitas a fortaleza inalcançável. Não, não desças, não finjas que não dói mais — é inútil negar asa partida. Arcanjo abatido, não tens onde pousar. Foge, assombro, foge, ainda é tempo — desdobra com esforço asa confrangida. Foge, dá à ferida a sua verdadeira medida e mergulha tua asa no mar.

01/09/2015

Ode à Primavera - Manhã de Setembro


Agosto se vai,
desanuviado pelo tempo.
Levando as tempestades da alma,
que tomaram meu calento.

Oh, Setembro!
Traga seus raios de sol,
leve a tempestade embora,
e deixe tudo prol.

Chuva de agosto,
deixe-me viver setembro,
mesmo que à contragosto,
quero ode à primavera.

Oh, Primavera!
Tão linda.
Tão clara.
Tão serena.
Deixa florescer em meu peito,
sua rosa-damascena.

O frio se vai.
Em São Paulo não tem geleira.
Os dias cinzas estão indo embora.
As cores estão vivas.
Tão lindas.
Tão claras.
Tão serenas.
Setembro chega.
Sua beleza nos fascina.
A primavera logo vem.
Este mês será melhor do que imagina,
pode acreditar em mim, meu bem!