31/08/2013

Je t'aime!

Enrosquei meus dedos dentro do apertado bolso de minha calça, procurando aquele maldito bilhete que havia recebido de manhã.

 "Me encontre no Parque Bela Vista, preciso falar com você. Espero que compreenda, 
   Estarei te esperando próximo à barraca de cachorro quente, lembra-se dela? 
   Abraços,
   Alberto." 


Que cretino! Como eu poderia me esquecer das tardes ensolaradas em que eu e ele passeávamos pelo parque, nossos dedos entrelaçados, como dois jovens apaixonados, namorando no banco atrás da barraquinha de cachorro quente?

Lembro claramente do sol batendo em meus olhos, e da forma como Alberto me encarava fixamente e dizia que me amava. Costumávamos intercalar nossas conversas entre o português e francês. Talvez fosse uma dessas coincidências de casais, mas éramos apaixonados pelas mesmas coisas.

É angustiante falar isso no passado, mas ainda sinto aquela pequena reviravolta no estômago quando as lembranças me vêem à mente, e um arrepio estranho passa das unhas de meus pés até meu último fio de cabelo quando lembro de seu toque sob meu corpo.

Para de bobagens, menina! Se ele fosse tudo isso, não teria simplesmente sumido de minha vida durante meses, para depois simplesmente voltar como se nada houvesse acontecido. Atravessei a rua que dava para a Avenida Principal, e avistei ao longe a praça.

Fiquei nas pontas de meus pés, na inútil tentativa de avistá-lo ao longe. Claro que eu não conseguiria, mas fechei meus dedos tentando me controlar para o impacto que seria vê-lo novamente. Caminhei pela calçada, que, estranhamente não estava lotada de pessoas, e encontrei rapidamente a barraca de cachorro quente.

Curioso! Desde que saíra de minha vida, simplesmente não sentia o mesmo apetite por aquilo. Não me parecia tão romântico como outrora... a magia do lugar havia sido levada, assim como uma casa após um grande deslizamento de terra. Fui até o banco que ficara atrás da barraca, mas nada de Alberto.

Talvez ele tenha te enganado novamente, Charlotte! Bom, esse bolo apenas entraria para a pequena lista de decepções. Me virei para ir embora, mas um corpo atrapalhara minha passagem.

Um pouco mais alto do que eu, cabelos desalinhados e escuros, e incríveis olhos castanho escuro que me encaravam freneticamente, como se soubesse até mesmo de meus segredos mais íntimos. Tinha um leve bronzeado na pele pálida, que era o suficiente para aumentar seu charme quando deu aquele sorriso no canto dos lábios que eu tanto conhecia.

- Charlotte! - ele pronunciou meu nome como um locutor lendo uma declaração apaixonada.
- Alberto! - Exclamei, dando de ombros e revirando os olhos para cima.
- Você mudou! - Disse ele, com os olhos brilhando de ansiedade.
- Você não poderia esperar que encontraria a mesma Charlotte tonta de sempre.
- Não foi isso o que eu quis dizer. - Falou ele, me fazendo um gesto silencioso para que eu me sentasse naquele que costumava ser o nosso banco.

Durante alguns segundos, ficamos imóveis e mudos. Não sabia eu como deveria agir. Me levantar e ir embora? Perguntar o motivo daquele "encontro"? Optei pela segunda opção, mas acho que nossa telepatia ainda funciona em sintonia, pois ele se adiantou.

- Acho que você quer saber o motivo pelo qual te chamei aqui. - Começou, hesitante. - Sinto que não deveria ter feito isso com você. Eu queria fugir de mim mesmo, e acabei espantando você.
- Não me venha com esse papinho furado! - disse, me virando para ele e esbofeteando-o na cara. - Você acha que simplesmente pode voltar e ter tudo o que você quiser de volta? Olha aqui, Alberto, se você pensa que eu vou...

Mas ele fora mais rápido. Pegou meus braços, me enlaçou pela cintura e me deu um beijo morno, mas na temperatura ideal para me fazer lembrar como era estar em seus braços. Tentei me desvencilhar, mas seu impacto sobre mim era muito maior do que minhas forças e bom senso. Ele parou, me fixou nos olhos e puxou do bolso de sua jaqueta um pequeno lenço dobrado e o entregou para mim.

Peguei-o perplexa, e abri lentamente. Dentro dele, uma frase estava bordada acima de um pequeno coração dourado: Je t'aime! 

- Você sabe que eu não acredito nisso...
- Não precisa acreditar quando o sentimento existe e é verdadeiro. - falou, cabisbaixo. Parecia envergonhado por algo. Ainda encarando seu tênis de marca desconhecida, me sussurrou. - Não queria que as coisas entre nós tivessem ocorrido dessa forma. Seria mais fácil se eu pudesse contar para você tudo o que sinto, os motivos que me fizeram ir... mas pode ter a certeza de que o único motivo que me fez voltar, foi por saber que eu poderia vê-la novamente.

Dessa vez, quem o surpreendeu fui eu, pois levantei sua cabeça com a ponta de meus dedos, e beijei-lhe suavemente. Não me importaria se fosse me arrepender mais tarde, mas o que eu queria naquele momento era manter esse contato entre nós.

O beijo talvez não tenha sido o melhor de toda a minha vida, mas, naquele momento foi o suficiente para salientar nossas almas e manter acesa, pelo menos por um instante, a chama daquele amor que um dia existiu. Que ainda existia!

25/08/2013

A criança dentro de nós!

Domingo passado fui em um piquenique com alguns amigos da escola(sim, demorou uma semana para que a inspiração para escrever isso viesse).
Tinha pouco tempo para aproveitar, pois dali uma hora tinha outro compromisso.
É como dizem: Você nunca tem nada para preencher seus dias, e quando tem, aparecem diversas coisas em horários parecidos.
Comi rapidamente pois não estava com tanto apetite naquela tarde, e chamei uma amiga minha para darmos uma volta.
O lugar era uma represa bastante conhecida na cidade e longe pra caramba. Havia um lago enorme, que separava o playground e as mesas de fazer da casa do dono.
Era um lugar aconchegante. Havia uma trilha por onde os carros passavam e dava perfeitamente para andarmos de bicicleta.
O lago me lembrava muito um no qual eu era protagonista em diversos sonhos.
É estranho, mas eu já havia sonhado com aquele lugar, sem nunca ter pisado ali.
As mesas estavam sujas, talvez pelos macacos que ali moravam, mas não deixava de ser o lugar ideal para um passeio com os amigos.
Chamei minha amiga mais íntima e nosso outro amigo para darem um passeio comigo.
Já que não conhecia o lugar, nada melhor do que explorá-lo para ser apresentada a ele.
Pegamos a bicicleta, e após dar uma pequena volta nos arredores, decidimos entrar no playgroud. 
Não era grande coisa. Para ser sincera, aquele era um lugar onde crianças iriam para brincarem um pouco, mas não tinha importância.
Queria por um momento voltar a ser criança, sentir a areia entre meus dedos (e meus cabelos, roupas), o resultado seria diversão.
Encontramos uma gangorra diferente, em que deveríamos entrar em um pneu e ficar pulando de cima para baixo.
Quase entalei (quando digo que era para crianças, não é exagero), mas o riso foi garantido.
Dizer que "brinquei" naquele dia, pode soar um tanto infantil (e é mesmo), mas eu repetiria aquele momento várias e várias vezes, afinal, quando se vive praticamente em um mundo de adultos, voltar a ser criança por um breve instante pode ser um refúgio para nossas mais singelas perturbações.
Pode ser um refúgio para nossa alma...

18/08/2013

Defeitos, defeitos... qualidades?

Frequentemente, nos deparamos com algum pequeno defeito que gostaríamos de reparar em nós mesmos.
Ou eu sou magra demais, e muitos vivem me perguntando se sou anoréxica; se estou acima do peso sou uma obesa, a qual nenhum roupa me cai bem.
Meu cabelo pode não ser o mais perfeito, mas caso seja cacheado, eu gostaria que fosse liso para melhor cuidá-lo.
Se tenho cabelo liso, gostaria que fosse cacheado, para melhor apreciá-los.
Será que nunca aceitaremos a nós mesmos do jeito que nascemos?
Aceitar que somos imperfeitos é fácil, mas admitir nossa imperfeição quando estamos tentando agir como deuses é difícil...
Já parou para pensar que o defeito que lhe intriga em si, pode ser vista justamente como uma qualidade admirada por outra pessoa?
Quantas vezes você já não quis mudar algo fisicamente?
Mas quantas vezes você se perguntou se alguém gostava de você justamente por aquilo que lhe incomoda?
Se outros conseguem admirar isso em ti, por quê não o consegue?
Será que a sua imperfeição tem tornado-o cego perante si, ou simplesmente não consegue aceitar o fato de que possui mais qualidades do que pode imaginar?

11/08/2013

Um sentimento chamado "sei lá"

As vezes eu me sinto como se eu tivesse o dom de estragar tudo e piorar todos os tipos de situações possíveis.
Muitas vezes eu só gostaria de voltar no tempo e consertar algumas bobagens que fiz.
Acreditem, não foram poucas vezes que tentei ajudar alguém e a situação fugiu ao meu controle...
Tento ser "boa" e legal com as pessoas, demonstro que me importo (e de verdade), mas isso geralmente me leva a caminhos piores.
Me pego pensando se não seria muito mais fácil deixar tudo como está, cada um seguindo seu caminho, mas eu tento interferir.
Não foi a primeira vez que fiz algo do tipo nos últimos 15 dias, e ainda me meterei em mais encrencas do tipo. Mas por que sou assim?
Sei que sempre tenciono a errar feio do que ajudar e pronto, mesmo assim, persisto em erros..
Talvez por eu ser do tipo que não desiste até acertar, eu tentarei ajudar as pessoas até que eu acerte...
Mas quantas vezes mais errarei e prejudicarei aqueles que estão ao meu redor, tentando acertar?

01/08/2013

Uma manhã qualquer...


“O trabalho humaniza as pessoas.”

Frase piadista do meu livro de Filosofia
06h25.
Sofia encarou o relógio com muito pesar, mas a realidade estava à sua porta: deveria levantar para ir ao trabalho.
Lavantou-se com o ânimo de um zumbi andando, e foi lavar-se.
07h00.
O ônibus já estava chegando ao ponto e ela olhou para a mensagem de texto que havia recebido de um amigo. Ótimo, o dia seria apenas mais um como todos os outros.
Passou pela mesma paisagem, a qual via todos os dias naquele mesmo horário, encontrou as mesmas pessoas de sempre, que debatiam sobre os mesmos assuntos.
“Olha a cor do esmalte que eu to usando.“
“Briguei com o namorado, acho que vou largar dele.”
“Ontem choveu e acabou com a minha chapinha.”
“A passagem tá cara, né?”
Etc, etc, etc.
Mesmos assuntos, mesmas pessoas.
Sofia sabia que ela também reclamaria da chuva que estragou seu cabelo, e que mandaria as mesmas mensagens para as mesmas pessoas de sempre, pois seus assuntos raramente se divergiam.
Tomou o segundo ônibus, e dessa vez foi sentada, olhando o caminho já familiar a seus olhos.
Pensou com lamúria no seu salário que receberia naquele dia e nas formas de gastá-lo.
Acho que vou comprar um lanche na esquina. Outro dia compro um lanche na rodoviária, e tenho que experimentar alguma lanchonete do centro... pagar minhas despesas, comprar, guardar para o futuro...
Era desanimador pensar que após começar a trabalhar, ela só pararia depois que sua vida tivesse passado, então Sofia fazia de tudo para ter o mínimo de diversão garantida em seus dias.
Seu trabalho não era dos mais pesados, ao contrário, era único e não exigia tanto esforço de si.
Olhou-se no espelho e ficou insatisfeita com a imagem reproduzida.
Precisaria de uma hidratação no cabelo também, pois sua situação estava precária.
A faxineira aparecera para limpar sua sala, e ela sentiu a necessidade de puxar conversa. Não que achasse que era a obrigação conversar com outras pessoas, mas Sofia gostava de manter o mínimo de educação com todos.
Fora muito bem educada, por sinal.
A outra mulher apresentava em sua face marcas de que sua vida havia sido dura e sofrida, aparentando no mínimo 40 anos de idade. Mas como nada é o que parece ser, a mulher tinha apenas 26.
Sem sonhos, nem perspectiva de vida, a faxineira mantinha o olhar baixo e era de poucas palavras. O sorriso não parecia convir em seu rosto tristonho.
Sofia sentiu a súbita necessidade de saber mais sobre a mulher, sua história de vida.
Queria conhecer as experiências pelas quais ela passara e a transformara assim...
Ela, que se chamava Tatiane, tinha um filho de nove anos de idade, e um marido desempregado em casa.
Um passado sofrido, e no final do mês, o mesmo salário que Sofia recebia, mas no caso de Tatiane, era usado para manter sua pequena família.
Sofia se sentiu subitamente egoísta por desperdiçar tanto do que ganhava com coisas mesquinhas, enquanto com o mesmo salário, uma mulher guerreira sustentava com muito pesar aqueles que amava.
Mas será que havia cabimento em se sentir assim?
Não era sua culpa se o mundo era injusto com os menos favorecidos, ou que a mulher trabalhasse mais do que Sofia. Ou mais ainda, pelo salário que a outra ganhava.
Não tinha culpa pelos problemas do mundo, ela não o produzira, apenas nascera para ser habituada a ele.
Sua vida era forçosamente capitalista, mas seus sentimentos eram de uma socialista que ainda tinha a grande esperança de que um dia o mundo poderia mudar para melhor, e quem sabe nesse novo mundo, todas as pessoas teriam seu valor exposto não apenas na conta bancária, mas na forma de serem tratadas por outros.
O trabalho a havia humanificado, pois acrescentara experiência de vida para sua bagagem de conhecimento, mas e a pobre mulher, o que ganhara?
Seu trabalho era digno, mas seu salário não pagava nem um décimo do valor que representava como pessoa.
Sofia tinha culpa disso? Não, mas ela viu a necessidade de mudar seus conceitos de vida.
Não poderia ajudar a todos sem antes ajudar a si mesma, mas de uma coisa ela estava certa: independente da raça, cor, religião... ela ainda iria fazer algo que pudesse mudar a vida de alguém, dando-lhe esperança de vida, e um motivo para continuar...
Ela queria muito isso, mas boas intenções não eram capazes de mover uma palha.
Aquela era a hora de mover-se e ajudar a pobre mulher.
Mais do que isso, Sofia estaria ajudando a si mesma, a se tornar humana...