29/10/2012

Prólogo - Meninas de Seda




Uma intensa névoa que mesclava entre cinza e branco cobria a fachada da casa, mas ainda assim era possível ler uma placa rente ao portão, em material enferrujado e aspecto antigo:
Família Dolman
A fileira de teias de aranha descia rente ao portão. Em ambos os lados luminárias apresentavam um brilho resplandecente, que quase ofuscaram minha visão. Me aproximei da entrada, e o portão se abriu com um som agudo e terrível, como se alguém estivesse riscando uma lousa.
Enormes árvores cobriam a antiga trilha que levava diretamente para a porta principal da casa. Poucas folhas restaram nas árvores, a maioria estava caídas no chão, que emitiam um baixo ruído ao serem pisadas.
Eu caminhava pela trilha, e observava à minha frente uma silhueta bem definida, que andava à passos firmes. Era uma bela jovem. Suas madeixas ruivas pareciam uma enorme chama de fogo, que incendiavam sobre sua pele clara e sardenta.
Seus olhos negros pareciam procurar algo, preocupados. Atravessamos o final da trilha, chegando até a grande porta de mármore envelhecido.
Puxou a maçaneta freneticamente, mas não teve resultado nenhum.
“Está trancada!”, praguejou para si mesma, precedendo um palavrão.
Um brilho travesso lhe pendia no olhar. Decidida, ela fechou os olhos durante alguns segundos. Parecia estar concentrada.
Arregalei os olhos e joguei meu corpo para trás quando vi o que estava acontecendo. A garota estava se transformando bem na minha frente. A parte de trás de seu vestido roxo começou a se rasgar. Ela se dobrou em sua barriga, a dor deveria estar terrível.
Corri até ela na tentativa de ajudá-la, mas minhas mãos passaram por seu corpo. Olhei para mim mesma, a verdade se abatendo sobre mim: eu estava em um sonho. Não me sentia dormindo, tudo aquilo acontecia em mim de forma tão clara e intensa...
Me afastei da garota. Em suas costas, duas asas pontudas e suaves como seda surgiram. Elas me pareciam terem sido feitas sob medida para combinar com seu vestido, o qual lhe delineava completamente o corpo.
Deu um passo atrás e tomou um leve impulso, mas suficiente para transportá-la até o telhado da casa. Um enorme orifício no teto nos dava a certeza de que alguém já estivera ali. Tive o receio de que a pessoa ainda estivesse naquele lugar.
Ela descia suavemente, enquanto trovões irradiavam e raios formavam uma descarga elétrica. Os ferros entrecruzados que sustentavam as paredes da casa abandonada pareciam prestes a desabarem.
-Acho que vai chover. Não entendo como nenhuma gota de água ainda não caiu do céu. – um homem alto e loiro falou mansamente, aninhando um bebê em seu colo. Suas madeixas eram cacheadas, o que lhe dava aquele aspecto angelical, mas seu semblante era severo. O bebê dormia tranquilamente, como se em sua vida apenas houvesse paz.
- Jura que está preocupado com isso? – a jovem de cabelos rebeldes e ruivos disse, descendo do teto e parando em pé sobre a mesa. Suas asas se encolheram, até desaparecerem completamente.
- Não precisa usar desse sarcasmo comigo. – o homem rebateu, levantando charmosamente o canto direito do lábio.
- Quer que eu use de outro? – perguntou ela, fazendo uma careta e descendo da mesa. Suas mãos seguravam sua cintura fina.
- Vamos parar com isso, Victoria. – ele disse, seu rosto assumindo uma postura séria.
- Tudo bem. – Victoria respondeu, levantando as mãos em concordância. Seus olhos se concentraram no bebê que ele segurava. Ela parecia maravilhada pelo simples fato de estar tão perto da criança. – Você está se arriscando demais...
- Digo o mesmo a você! – ele respondeu, piscando suavemente um dos olhos para ela.
- Você sabe o que o Conselho faria caso soubessem que você está me ajudando. – ela respondeu, com melancolia em sua voz.
- É isso que os amigos fazem. – ele respondeu, decidido. – Ajudam uns aos outros.
- Então você acredita na minha inocência? – ela perguntou, olhando-o desconfiada. Sua sobrancelha esquerda se levantou.
- Mas é claro que sim! – ele respondeu, sem pestanejar. E olhando para o bebê em seu colo, completou: - Eu sei que você não faria tal crueldade.
Ela fechou os olhos por um momento, apertando a barriga com as duas mãos. Ele olhou para ela, e arregalou os olhos. Parecia ter compreendido tudo o que ela reprimira dizer.
- Você não... – ele mal pode completar seu pensamento, levando as pontas dos dedos ao lábio, perplexo.
Senti uma inexplicável pontada no peito, como se estivesse deixando passar algo que eu não notara.
- Sim! – ela respondeu, permitindo lágrimas rolaram em seu rosto.
- Eu não acredito que você fez isso! – ele bradou, alterando seu tom de voz.
- Era a única forma que encontrei de tentar salvar minha família. Livrá-la da maldição. – ela falou, enxugando as lágrimas. - Bem, eu posso ao menos segurá-lo? – ela disse, seus olhos pousando em direção ao bebê.
O homem baixou os olhos para a criança. Ele sabia que não poderia, mas olhar para aquela jovem de nome Victoria lhe dava um sentimento de compaixão.
- Você pode tentar. – ele respondeu, displicente. – Mas não garanto resultado nenhum.
Victoria assentiu, se aproximando dele e do bebê. Sua mão direita se levantou para tocar a face da criança, quando um pequeno campo de força surgiu em torno do menino. Pequenas faíscas brotaram nos dedos de Victoria.
- Sinto muito. – Paulo tornou a dizer, notando o visível sofrimento dela. – Tudo ficará bem. Você será in...
- Não precisa dizer mais nada. – ela replicou, tocando os lábios dele, com suas unhas compridas. – Já não tenho mais a certeza de que tudo ficará bem... – Ela fez uma breve pausa, mas retomou em seguida. – Só me prometa uma coisa.
- O que você quiser. – ele prontamente respondeu.
- Você cuidará dele por mim. – Victoria abaixou os olhos fixando-os no bebê. – Será seu guardião. Você conseguiu mantê-lo vivo, mas não posso garantir por quanto tempo. A
maldição não tardará a se realizar outra vez. – ela respirou fundo, e senti que ainda não tinha acabado. – Caso eu não sobreviva, você cuidará delas para mim?
Eu não sabia quem eram essas garotas as quais ela se referiu, mas o homem alto pareceu entender, pois ele assentiu.
- Quando será o momento certo para eles saberem de tudo? – ele questionou, parecendo se recuperar.
- Você saberá! Eu não sei o que acontecerá daqui para frente, mas saiba que pode contar com a ajuda de Ana. – depois dessa explicação esclarecedora e firme, ela deu uma última piscadela para o homem alto, e olhando para o bebê, seus olhos se perderam no vazio.
De repente, ela havia desaparecido, deixando apenas uma intensa névoa atrás de si.
Senti como se estivesse caindo em um poço, e tentando me agarrar ao que quer que aparecesse em meu caminho, para não me aprofundar mais. Mas o poço estava se tornando cada vez mais frio e escuro.
Eu tentei lutar com todas as forças, mas senti um medo me percorrer cada centímetro de meu corpo.
Acordei de um pulo em minha cama, com a sensação de que o pior ainda estaria por vir.

12 comentários:

  1. O prólogo está bom, mas fico confuso.
    Acho que a personagem estava sonhando mesmo, kkkkkk
    Gostei, vou acompanhar.

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    1. kkkk, fico feliz que tenha gostado.
      Ela realmente está sonhando, mas ficou confuso como?

      beijoos

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    2. O diálogo entre a garota e o cara. Achei um pouco confuso.

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    3. Ah, entendi. Era para ser um suspense, sabe? Se eu escrevesse mais claramente acho que eu acabaria dando spoiler, e essa cena terá grande influência e importância ao longo da história,

      beijos,

      Juliana.

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  2. Acompanhando!
    Você escreve muito bem Juliana!

    bjos

    Juliene Farnez
    http://ser-escritora.blogspot.com.br/

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    1. Olá Juliene, fico feliz que tenha gostado do prólogo e está acompanhando*-* Espero sua opinião nos próximos capítulos, hein?

      Beijos,

      Juliana.

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  3. Me deixou curioso. A Victoria aprontou pelo que ela está sendo condenada? Ela me pareceu ser bem jovem, por seu humor sarcástico e divertido, até mesmo em tempos que, ao meu ver, não permitem à ela ser irônica.
    Vim aqui por indicação de uma amiga, e continuarei acompanhando.
    Percebi que postou apenas até o capítulo seis. Espero que atualize.
    Abraços ^^

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    1. Olá Anônimo! Então... o que ela aprontou não é o que pensam que é, kkk. Atualizarei sim, em breve trarei novidades ^^

      Beijos.

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Olá Juliana!
    Acompanho consecutivamente o seu blog, e sou uma fã! Porém, ainda não tinha lido este seu livro.
    Vi o seu último post "A Volta da Meninas de Seda" e me interessei, realmente muito interessante.
    Espero que eu consiga ler até o fim.
    Parabéns, você escreve muito bem.
    Um beijo com amor, Lu :)
    http://escrevendoumlivrodicas.blogspot.com.br/

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    1. Oii Luma! Muito obrigada. Eu havia parado, mas quando retornar, será em outro blog (para não ficar muito tumultuado aqui no S.E.)

      Beijos.

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    2. Ah, entendi... Bom, na minha opinião, vai ser melhor, mais organizado. Boa ideia.
      Um beijo, Lu :)

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